segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

O nascimento da Viuvinha

Fiquei viúva pela primeira vez aos 10 anos. Ele se chamava Matheus e namoramos de mãos dadas, trocando bombons e bilhetinhos por 1 ano durante a quarta série. Uma vez me deu flores - um buquê de rosas vermelhas - na saída na escola e eu fui o centro das atenções (morri de vergonha, mas me achei o máximo). Até que vieram as férias e o ano acabou. Quando o ano acaba, acaba tudo. Isso eu aprendi cedo - foi o Matheus que me ensinou.

Ele sumiu do mapa. Provavelmente foi visitar a avó em alguma cidadezinha do interior, ou então foi passar as férias na praia com a família. Ou ficou em casa jogando bola com os amigos. Mas enfim, o fato é que Matheus desapareceu. Não o vi mais até o início da quinta série, quando ele secamente me olhou, não cumprimentou e foi para o canto falar com as amigas (sim, ele não tinha muitos amigos garotos). O resto do ano foi o inferno na terra - e o início de uma obsessão pela matança. Além de ficar sem namorado, sem resposta e sem bombons ainda era humilhada durante a educação física pelo maldito. Decidi matá-lo.

O via todos os dias, mas com o comando "/ignore mode on" consegui sobreviver aquele ano. Aprendi a lidar com a rejeição matando as pessoas ao meu lado - fingir que elas não existem mais, que nasceram, cumpriram a sua missão na Terra para mim e depois se foram. Anos depois conheci Fernando Pessoa, o poeta português, que fazia isso com seus heterónimos e ficou muito famoso. Achei cool matar as pessoas em pensamento e continuei com esta prática até os dias de hoje.  

Descobri que "declarando falência alheia" a vida se tornava mais suportável. É egoísmo querer lidar com tudo e todos, por isso ficar viúva por alguém é bom de certa forma. Você se lembra dos momentos bons apenas, esquece que essa pessoa ainda existe e que mora no mesmo bairro que você. Matar com o pensamento é a melhor saída. La Petit Veuve nasceu e vive assim, feliz.

Não descobri ainda se isso é patológico, mas a prática funciona.

Um comentário:

  1. Esse é o problema daqueles que carregam em si a essência em excelência de "dubialidades signatárias". Que contenham os opostos sobre natureza e que conseguem a arte da manipulação dos opostos. Sim e Não.

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